Fabio Godoy Teixeira da Silva
Para evitar a desvirtuação das cooperativas de trabalho de
serviços, o legislador incluiu a multa no valor de R$ 500 por trabalhador
prejudicado, podendo ser dobrada na hipótese de reincidência, que deverá ser
cobrada da cooperativa de trabalho e dos tomadores dos serviços.
No último dia 20 de julho de 2012, a Presidente da República,
Dilma Rousseff, sancionou a Lei 12.690, cuidando especificamente do
funcionamento das Cooperativas de Trabalho.
Apenas para lembrar, as sociedades cooperativas do ramo trabalho
passaram a receber maior atenção a partir da inclusão do parágrafo único no
artigo 442 da CLT. O referido dispositivo legal, ora revogado, dispunha que não
havia vínculo de emprego entre a cooperativa e o cooperado e nem entre este e o
tomador dos serviços. Com a declaração da inexistência de vínculo empregatício
inserto na norma celetista, o tipo societário passou a ser deturpadamente
utilizado para fins fraudulentos por inúmeros empresários agasalhados pelo
manto de supostos cooperativistas. Noutras palavras, muitas empresas começaram
a demitir seus funcionários e contratá-los apenas e tão somente através de
sociedades cooperativas, subtraindo-lhes todos os direitos trabalhistas de
outrora.
Neste cenário, muitas vezes, vislumbrou-se um pseudocooperado
laborando para um empresário sob os requisitos da norma celetista, ou seja,
mediante subordinação jurídica, pagamento de salário, de forma não eventual e
com pessoalidade, encerrando verdadeira relação empregatícia. Por isso,
inicialmente dezenas, depois centenas e finalmente milhares de trabalhadores inauguraram
reclamações trabalhistas em face das sociedades cooperativas e dos tomadores
dos seus serviços, alçando-os ao status de verdadeiros empregadores.
Como o Princípio da Primazia da realidade dos fatos impera do
Direito do Trabalho, em diversas atividades, o reconhecimento do vínculo de
emprego passou a ser voz corrente no Poder Judiciário em virtude do
aperfeiçoamento dos elementos descritos na norma na relação fática. A partir do
transbordamento dos interesses individuais, o Ministério Público do Trabalho
começou a investigar as relações de trabalho mantidas entre trabalhadores
cooperados e tomadores dos serviços, implicando a instauração de um sem número
de Procedimentos Preparatórios de Investigação, os chamados PPI´s e Inquéritos
Civis Públicos.
Muitos dos procedimentos de investigação culminaram em Ações Civis
Públicas com pedidos de abstenção de fornecimento de mão de obra através de cooperativas
e ainda a fixação de indenização pelo dano moral coletivo causado pela má
utilização do instituto cooperativista, castrando direitos de trabalhadores das
mais diversas categorias econômicas.
Em razão disso, especialmente em virtude da forte conduta do
Ministério Público do Trabalho em busca da cessação das fraudes perpetradas, as
sociedades cooperativas de trabalho de serviços minguaram e se aproximaram da
extinção, já que repudiadas pelos empresários, malvistas pelo Ministério
Público do Trabalho e pelo Poder Judiciário Trabalhista, o campo antes fértil
tornou-se ácido, sepultando por completo o desiderato doutrinário e universal
do sistema cooperativista, notadamente porque a simples menção ao termo
cooperativa de trabalho, naquela época, emprestava certa marginalidade aos seus
atores.
É verdade que houve e existem cooperativas de trabalho sérias, mas
infelizmente são incapazes de abalar positivamente as estatísticas. Assim, ao
invés do renascimento, a edição da Lei 12.690 pode ser considerada a gênese das
cooperativas de trabalho na medida em que terão de se reinventar para adequar
as novas exigências legais à realidade do mercado de trabalho e às necessidades
empresariais.
Dentre as principais inovações da novatio legis, está a garantia
de diversos direitos sociais, tais como recebimento do piso da categoria ou
salário-mínimo, jornada de trabalho não superior a 8 horas diárias e 44 horas
semanais, descanso semanal remunerado, descanso anual remunerado, seguro
acidente de trabalho, adicionais por horas noturnas e por atividades
desempenhadas em ambiente insalubre ou perigoso. Todos os direitos deverão ser
garantidos aos sócios das cooperativas de trabalho, que poderão definir a
constituição de fundos de custeio em Assembleias Gerais.
O número mínimo de sócios foi alterado, passando a ser exigido
pelo menos 7 (sete) sócios para a constituição, enquanto a Lei 5764/71 exige o
mínimo de 20 (vinte) cooperados. A Lei também privilegia a não precarização do
trabalho, a preservação dos interesses sociais e a efetiva participação dos
sócios cooperados em todos os níveis de gestão da cooperativa de acordo com o
previsto em lei e no estatuto social.
No artigo 4º da nova Lei, consta a definição das cooperativas de
trabalho de serviços, a qual deverá ser constituída por sócios para a prestação
de serviços especializados a terceiros sem os pressupostos da relação de
emprego, o que legitimamente espanca e obsta a criação das malfadadas
cooperativas multiprofissionais que muito contribuíram para a formação da alcunha
que ora se pretende desconstruir. A proibição para que as cooperativas de
trabalho sejam usadas como veículo para intermediação de mão de obra
subordinada está expressamente prevista no novo texto legal.
A eleição de um coordenador eleito pelos próprios cooperados para
organizar e coordenar as atividades dos demais sócios é um avanço e legaliza a
prática das sociedades cooperativas constituídas antes do marco legal, cujos
coordenadores já laboravam sob as mais diversas nomenclaturas, como, por
exemplo, líderes, gestores ou mesmo coordenadores. No entanto, com a nova lei,
além de exigir a eleição de um cooperado para o mandato de até um ano, ainda
impõe que a reunião de sócios definirá os requisitos para a consecução do
trabalho, os valores contratados e a retribuição de cada partícipe, ou seja,
exigir-se-á extrema maturidade dos profissionais envolvidos para que o
conhecimento dos valores pagos a cada um dos sócios cooperados não seja
elemento comparativo e fonte de atrito entre os personagens. A não eleição do
coordenador já implicará a presunção de fraude à legislação trabalhista, razão
pela qual o exercício do espírito democrático não se limita apenas ao campo
abstrato, haja vista que sua violação provoca efeito negativo, prático e
imediato. Aliás, tanto a majoração do quorum para a instalação das Assembleias
Gerais Ordinárias e Extraordinárias em terceira convocação de 10 (dez)
cooperados para 50 (cinquenta) cooperados ou 20% (vinte por cento) do número de
sócios para cooperativas com mais de 19 (dezenove) cooperados, como a criação
de mais uma Assembleia Geral Especial anual convergem no sentido de garantir
aos cooperados a autogestão do negócio cooperativista sob o espírito
democrático e participativo.
Para evitar o renascimento do modelo desvirtuado das cooperativas
de trabalho de serviços, o legislador incluiu a multa no valor de R$ 500 por
trabalhador prejudicado, podendo ser dobrada na hipótese de reincidência, que
deverá ser cobrada da cooperativa de trabalho e dos tomadores dos serviços. O
destino das multas será o FATES, exatamente como já ocorre atualmente com as
indenizações exigidas pelo Ministério Público do Trabalho nas ações civis
públicas. Por fim, a Lei institui o
Pronacfoop (Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho), com o
objetivo de promover o desenvolvimento e a melhoria do desempenho econômico e
social das cooperativas de trabalho. Entre as finalidades do Pronacoop, estão o
apoio à viabilização de linhas de crédito, acompanhamento técnico, o acesso a
mercados e à comercialização da produção. O programa será gerido por um
Conselho Gestor que terá composição paritária entre o governo e representantes
das entidades de representação das cooperativas de trabalho.
Finalmente, as cooperativas de trabalho constituídas antes da vigência
da Lei 12.690 terão o prazo de 12 meses para se adequar. Portanto, as novas
cooperativas de trabalho de serviços terão um estimulante desafio pela frente.
Deverão aglutinar trabalhadores de atividades específicas, encontrar
empresários dispostos a contratá-los, organizar os trabalhos, divulgar entre os
sócios os resultados financeiros e as participações individuais, tudo sem
intermediar a mão de obra subordinada e sem permitir a presença dos demais
elementos do vínculo empregatício. No entanto, cumpridos os requisitos legais,
poderão proliferar e garantir renda e trabalho aos obreiros dispostos a exercer
o empreendedorismo a partir da mútua-ajuda e do cooperativismo, resultando em
ganhos extraordinários não apenas para os cooperados, mas também para toda a
sociedade.
O marco legal das cooperativas de trabalho está lançado! Mas a sua
consolidação como verdadeira alternativa para melhor geração de renda e
trabalho dependerá da postura dos cooperativistas e, por isso, compete-lhes a
responsabilidade de afastar qualquer indício de conduta repreensível, pois
somente assim o sistema emergirá austero, sério e, principalmente, confiável!
Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/22506/cooperativas-de-trabalho-genese-ou-renascimento#ixzz2742i2Xeq
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