Uma empresa de informática de Belo Horizonte (MG) foi condenada a
pagar verbas rescisórias e multa a um analista de sistemas por tentar mascarar
o vínculo de emprego por meio de contrato de prestação de serviços de pessoa
jurídica. Ao examinar o caso, a Terceira Turma do TST manteve o entendimento do
acórdão regional, ao não conhecer do recurso da Stefanini Consultoria e
Assessoria em Informática Ltda.
O analista trabalhou como pessoa jurídica, ou
"pejotizado", como ele mesmo definiu na reclamação, de 2007 a 2009.
Ao ser dispensado, pediu o reconhecimento do vínculo de emprego, alegando que
havia outros analistas de sistemas contratados com carteira de trabalho
assinada. Afirmou que jamais podia se fazer substituir por outra pessoa e
atuava na atividade-fim e nas dependências físicas da Stefanini, que fornecia
todos os recursos de trabalho.
Declarada a nulidade do contrato de prestação de serviços e reconhecido
o vínculo empregatício na primeira instância, a empresa recorreu ao Tribunal
Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), que manteve a sentença. Para o
Regional, não havia dúvidas, pelos depoimentos prestados em juízo, da
existência de subordinação jurídica e dos demais requisitos para caracterização
do vínculo de emprego.
Em relação à subordinação típica da relação de emprego, o TRT-MG
destacou que ficou demonstrada a ingerência da empregadora sobre o trabalho do
autor. Para o Regional, a argumentação da empresa sobre a possibilidade de
trabalho em domicílio e sobre a ausência de controle de jornada não
descaracteriza a subordinação própria do contrato de trabalho e,
principalmente, não imprimem caráter eventual à prestação de serviços.
O Regional destacou que o analista era cobrado por produção e
cumpria horário. Uma testemunha apresentada pela própria Stefanini afirmou que
ele trabalhava de segunda a sexta-feira, oito horas por dia, com duas horas de
intervalo, sendo assim indiscutível a habitualidade dos serviços. Por fim,
concluiu que a constituição de pessoa jurídica pelo autor - mesmo que anterior
à prestação de serviços à empregadora - e o contrato civil assinado entre eles
não subsistiam diante da realidade, porque, de acordo com os autos, o que se
verificou foi que o objetivo era "mascarar a verdadeira relação jurídica
existente" - o vínculo empregatício.
TST
A alegação da empresa, no recurso de revista, de que a
manifestação de vontade da parte no momento da contratação se deu de boa-fé e
que o contrato, uma vez assinado, produz todos os efeitos no mundo jurídico não
mudou o rumo do processo. Para o relator do recurso, juiz convocado Flávio
Portinho Sirangelo, prevaleceu o princípio da primazia da realidade diante do
quadro fático apresentado pelo TRT-MG.
O relator esclareceu que a jurisprudência do TST é de que a
constituição de pessoa jurídica pelo trabalhador não tem, por si só, o poder de
afastar a caracterização da relação de emprego quando são atendidos os
requisitos do artigo 3º da CLT - prestação de serviços não eventual, com
pessoalidade e remuneração e sob subordinação -, como foi o caso. Assim, a
decisão que declarou a nulidade do contrato de prestação de serviços e
reconheceu o vínculo de emprego não violou os artigos 110, 113 e 114 do Código
Civil brasileiro, como alegava a empresa.
Processo: RR-650-80.2010.5.03.0004
FONTE: TST
Nota-Equipe Técnica ADV: A constituição de pessoa jurídica para a
prestação de serviços vem se tornando praxe empresarial fraudulenta. A
contratação de serviços mediante pessoa jurídica que é, em princípio,
admissível como negócio jurídico, na verdade funciona como roupagem de que se
reveste o trabalhador, por induzimento da empresa, para poder ser contratado
com a redução de encargos trabalhistas, previdenciários e fiscais.
Este fato tem conduzido o Judiciário, em inúmeras causas
trabalhistas, a sua intervenção. Com o objetivo de proteger o empregado e
evitar fraudes aos direitos trabalhistas, os atos praticados com o intuito de
desvirtuar e impedir a aplicação dos preceitos contidos na CLT estão sendo
considerados nulos de pleno direito.
Nesses casos deve ser analisada a forma pela qual os serviços são
desenvolvidos. Então, se na prática ocorrer uma relação de emprego - aquela com
as características de pessoalidade, não eventualidade, onerosidade, dependência
e subordinação - a forma cede lugar a situação real, reconhecendo-se o vínculo
empregatício. É o que comumente é chamado, no âmbito do Direito do Trabalho, de
princípio da primazia da realidade, segundo o qual, na análise das questões
relativas às relações de trabalho, deve-se observar a realidade dos fatos em
detrimento dos aspectos formais que eventualmente os atestem.
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