14 de mar. de 2011

Proteção do consumidor no comércio eletrônico

As relações humanas sofreram grandes modificações com o surgimento da internet, uma vez que esta ferramenta se popularizou e atualmente alcança todas as parcelas da sociedade, trazendo maior comodidade em relação ao consumo, o qual se torna cada vez mais fácil e abrangente. (...) Ocorre que esta nova forma de contratação trouxe diversos questionamentos acerca da proteção do consumidor nos contratos eletrônicos, especialmente quanto à aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) e a vulnerabilidade do consumidor, uma vez que este nem sempre está consumindo de forma segura e confiável.
 Elaborado por Karine Behrens da Silva


1. INTERNET E COMÉRCIO ELETRONICO
A internet revolucionou a vida das pessoas, os negócios, os relacionamentos e os contratos, trazendo eficiência na comunicação, apesar de oferecer sistemática vulnerabilidade quanto ao sigilo de informações privadas.
Deste modo, a internet surgiu como uma reconfiguração das relações entre as pessoas e revolucionou também a economia, possibilitando oportunidades econômicas às empresas, empregados e consumidores de uma maneira nunca vista antes.
Outro fator relevante é que conduz ao corte de custos e conseqüentemente ao aumento de receitas e lucro. Isso se deve ao fato de que através do e-commerce o individuo contrata com apenas alguns cliques, o que facilita e agiliza as relações mercantis.
Além disso, a internet é um instrumento de interligação de pessoas em tempo real em qualquer parte do mundo, dinamizando as transações comerciais.
Portanto, atualmente constata-se uma grande mudança na forma de comércio tradicional, gerando um impacto que se compara ao da época das grandes navegações da Idade Média, que modificaram imensamente a forma de comércio antes existente 
Quanto ao comércio eletrônico, ou e-commerce, Rogério Montai de Lima ] assim o conceitua:
Por comércio eletrônico entendem-se todas as relações negociais que são realizadas tendo como instrumento o computador. Tais relações podem se dar via fac-símile, telefone ou vídeo-fone; correio eletrônico; interação de uma pessoa com um banco de dados programado para receber pedidos de compra; ou interação de dois computadores programados para contratarem sem interferência humana. Em sentido lato, considera-se comércio eletrônico como todas as transações comerciais efetuadas eletronicamente, com o objetivo de melhorar a eficiência e a efetividade do mercado e dos processos comerciais. Este processo engloba a venda à distância e a venda realizada por máquinas.
O comércio eletrônico pode ser definido em sentido amplo como uma forma de fazer negócios através de sistemas e redes eletrônicas. Lato sensu, assim, engloba as atividades negociais juridicamente relevantes.
Constata-se, pois, que a internet e o comércio eletrônico propiciam grandes oportunidades de negócios e inúmeros benefícios. Contudo, existem diversos desafios a serem enfrentados, principalmente quanto à segurança, especialmente de informações privadas, quanto ao meio de pagamento, forma de entrega da mercadoria e foro competente.

2. CONFIANÇA E VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR NO COMÉRCIO ELETRÔNICO
Embora o princípio da confiança não esteja positivado em nosso ordenamento jurídico, este decorre dos princípios da transparência e da boa-fé e consiste na credibilidade que o consumidor deposita no fornecedor ou no vínculo contratual.
No que se refere ao comércio eletrônico, Claudia Lima Marques  acredita que este princípio pode ter sido abalado pelo meio virtual em virtude de diversos fatores, dentre eles, a complexidade do meio virtual, da distância, pela despersonalização, atemporalidade e internacionalidade, o que gera certa desconfiança dos consumidores.
Neste sentido, segundo Fábio Ulhoa Coelho, a confiança é a chave para o desenvolvimento do comércio eletrônico, pois muitos consumidores desconfiam do meio virtual, temem que suas informações pessoais sejam espalhadas, etc. Assim, para que o comércio eletrônico se torne uma alternativa de consumo, acredita que este deve inspirar credibilidade.
Para Cláudia Lima Marques  a confiança no comércio eletrônico somente é obtida através da transparência, a qual pode levar o consumidor ao consenso ou declaração de vontade racional.
Ainda no que tange à necessidade da confiança do consumidor no comércio eletrônico, Cláudia Lima Marques conclui:
Ao final deste trabalho, repita-se que a confiança é o elemento central da vida em sociedade, e, em sentido amplo, é a base de atuação dos consumidores. Se o Direito encontra legitimidade justamente ao proteger as expectativas legítimas e a confiança (Vertrauen) dos indivíduos, parece-me o momento oportuno de propor normas voltadas justamente para responder os desafios de desconstrução e reconstrução da dogmática contratual propostos pelo crescente comércio eletrônico de consumo no Brasil. (grifo nosso)
O princípio da vulnerabilidade, o mais relevante para o Direito do Consumidor, cujo caráter é protetivo, já que esta é a característica fundamental do consumidor, tem por finalidade ensejar uma igualdade real entre os sujeitos da relação de consumo e está disciplinado no artigo 4º, I, do Código de Defesa do Consumidor.
Conforme Sérgio Cavalieri Filho, "em outras palavras, a vulnerabilidade é a própria razão de ser do nosso Código de Defesa do Consumidor; ele existe justamente porque o consumidor está em posição de desvantagem técnica e jurídica em face do fornecedor."
Quanto à vulnerabilidade do consumidor no comércio eletrônico, Cláudia Lima Marques  destaca a vulnerabilidade técnica:
Inicialmente mister destacar a vulnerabilidade do consumidor quando se utiliza do meio eletrônico. Em outras palavras, o meio eletrônico, automatizado e telemático, em si, usado profissionalmente pelos fornecedores para ali oferecerem os seus produtos e serviços aos consumidores, representa aos consumidores leigos, um desafio extra ou vulnerabilidade técnica. O consumidor não é – mesmo que se considere – um especialista ou técnico em computadores e na Internet.
Ademais, na obra "Confiança no Comércio Eletrônico e a Proteção do Consumidor", Cláudia Lima Marques ]disserta da seguinte forma quanto à vulnerabilidade no comércio eletrônico:
A importante pergunta que se coloca é se este meio eletrônico realmente aumentou o poder decisório do consumidor/cibernauta. A resposta é novamente pós-moderna, dúbia (claroscuro, em espanhol), porque a Internet traz uma aparência de liberdade, com o fim das discriminações que conhecemos (de cor, sexo, religião etc) e o fim dos limites do mundo real (fronteiras, línguas diferentes, riscos de viagens etc), mas a vulnerabilidade do consumidor aumenta. Como usuário da net, sua capacidade de controle fica diminuída, é guiado por links e conexões, em transações ambiguamente coordenadas, recebe as informações que desejam lhe fornecer, tem poucas possibilidades de identificar simulações e ‘jogos’, de proteger sua privacidade e autoria, de impor sua linguagem. Se tem uma ampla capacidade de escolher, sua informação é reduzida (extremo déficit informacional), a complexidade das transações aumenta, sua privacidade diminui, sua segurança e confiança parecem desintegrarem-se em uma ambigüidade básica: pseudo-soberania do indivíduo/sofisticação do controle! (grifo nosso)
Rogério Montai de Lima ] destaca que, conforme cresce o uso da internet, a vulnerabilidade do consumidor vem sendo constatada no ambiente virtual, uma vez que o consumidor brasileiro tem habitualmente seus direitos violados por empresas inidôneas.
Jean Carlos Dias ], por sua vez, considera que "em se tratando de contratos de consumo efetuados em meio virtual, o consumidor, por definição, não somente se apresenta como parte vulnerável mas também como hipossuficiente, em razão do evidente fator de adversidade decorrente do elemento tecnológico."
Fábio Ulhoa Coelho, de modo contrário, entende que a vulnerabilidade do consumidor no comércio eletrônico é a mesma do que no ambiente físico ou até menor, citando como exemplo o caso de um consumidor que quer apenas buscar informações acerca de um produto. Para ele, o consumidor é mais passível de constrangimento no ambiente físico, uma vez que certamente o vendedor buscará convencê-lo a comprar o produto, enquanto no ambiente virtual ele pode buscar informações com maior calma, sem ser pressionado a adquirir o bem. Conclui, portanto, que neste sentido a vulnerabilidade no comércio eletrônico é menor.
Contudo, convém destacar que a vulnerabilidade do consumidor, em sentido amplo, é qualidade intrínseca e indissolúvel de todos que se colocam nesta condição, seja a relação de consumo estabelecida de forma tradicional ou através do comércio eletrônico, uma vez que a vulnerabilidade não se trata de mera presunção legal e, por isso, não admite prova em contrário. 

3. DIREITO À INFORMAÇÃO
No comércio eletrônico o direito à informação é de suma importância para o consumidor, uma vez que, além de fornecer informações claras sobre o produto ou serviço, o ofertante deve também disponibilizar informações específicas sobre o meio tecnológico utilizado. 
Cláudia Lima Marques  ressalta que o dever de informar do fornecedor é uma das maiores preocupações de todos os projetos de lei e do direito comparado. Destaca, ainda, que no meio virtual é importante o tempo da informação, a clareza desta, assim como a língua e a identificação do fornecedor.
Neste contexto, Armando Alvares Garcia Junior  enfatiza que, antes da celebração do contrato eletrônico, o consumidor deve ter acesso às seguintes informações:
a.    identidade do fornecedor e, em caso de contratos que requeiram o pagamento antecipado, sua direção;
b.    características essenciais do bem ou do serviço;
c.    preço do bem ou do serviço, incluídos todos os impostos.
d.    gastos de entrega, sendo o caso;
e.    modalidades de pagamento, entrega ou execução;
f.     existência de um direito de resolução;
g.    custo da utilização da técnica de comunicação à distancia quando se calcule sobre uma base distinta da tarifa básica;
h.    prazo de validade da oferta ou do preço;
i.      quando seja procedente, a duração mínima do contrato, quando se trate de contratos de fornecimento de produtos a serviços destinados a sua execução permanente ou repetida.
O autor também chama a atenção para dois aspectos importantes quanto à disponibilização da informação no comércio eletrônico no Brasil: primeiro, a insuficiência ou ausência de informações sobre o direito de resilição por parte do consumidor; segundo, a falta de exigência de um portal de informações referentes aos serviços pós-vendas e de garantias comerciais existentes.
Como melhor explica Cláudia Lima Marques, in verbis:
[...] deve o consumidor receber todas as informações que possam criar confiança na existência, tais como endereço, os registros do fornecedor com quem está contratando, os endereços que deve procurar em caso de arrependimento, e as informações sobre os custos de arrependimento. As informações mais importantes, porém, são aquelas – que também devem ser prévias – sobre o conteúdo do contrato, o preço exato, os custos extras e típicos do meio (custos de transportes, impostos etc.).
A autora também ressalta que a informação clara, leal e precisa é essencial para criar a confiança do consumidor no comércio eletrônico.

4. O CONTRATO ELETRÔNICO
Em virtude do advento da internet e do crescimento do comércio eletrônico surgiu a necessidade de uma nova forma de contratar, o que fez nascer o chamado contrato eletrônico. 
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